Era uma daquelas manhãs agradáveis que precedem um Outono
fresco. O pequeno-almoço estava tomado e o encontro marcado. Numa das salas da
DECO esperava-nos o Dr. Alberto Regueira, sócio fundador da Associação de
Defesa do Consumidor, e que recentemente passou de Vice-Presidente a Presidente
da Assembleia Geral. No entanto, não era sobre a DECO que íamos falar, isto
porque, Alberto Regueira ocupa também o cargo de Presidente da Direcção do CID
Sénior, Movimento de Cidadania Sénior, e essa era a Associação que nos
interessava.
Acompanhado pela Engª Celeste Coimbra, membro da Direcção
Executiva do Cid Sénior, receberam-nos amavelmente, prontos para uma boa conversa
sobre todo o ADN do Movimento, como nasceu, como cresceu e o que pretende.
As dificuldades que Portugal tem enfrentado nos últimos
anos passou a ser senso comum, até as crianças já falam de crise. Essa crise
tem sido em grande parte suportada pelos reformados e pensionistas, que viram
as suas pensões reduzidas como forma de sustentar o país, em prol de interesses
mais políticos do que sociais. Como se não fosse suficiente que recaíssem sobre
os mais velhos grande parte do sustento do Estado, ainda um dos príncipes da
retórica que fala muito mas diz pouco, Carlos Peixoto, deputado do PSD,
conseguiu baixar ousadamente o nível de ignorância, referindo-se aos
pensionistas e reformados portugueses como a “Peste Grisalha”, num argumento
que, fosse qual fosse o ponto de vista, seria sempre ofensivo.
Foi neste ambiente económico, político e social, que
alguns movimentos em defesa dos seniores se começaram a formar, e o CID Sénior
não foi diferente. “Finais de 2012 princípios de 2013, um conjunto de pessoas
começaram a sentir-se maldispostas, irritadas, inconformadas, com o facto de
haver tentativas pertinazes na sociedade portuguesa de atirar de alguma forma
os custos da crise e do ajustamento para cima dos seniores, reformados e
pensionistas. Sobretudo, para além do cortar nas pensões, o que os políticos
pensavam era que os mais velhos estavam a mais, a ocupar tempo, e espaço. Então
houve um conjunto de pessoas que além de acharem isto estúpido e malcriado, era
uma desconsideração” diz-nos o Dr. Alberto Regueira. Motivadas por esta
desconsideração, um grupo de pessoas conhecidas, com papéis relevantes na
sociedade portuguesa, começaram a reunir-se e a trocar impressões. Uma das
questões principais desses encontros, era se existia a necessidade de criar uma
nova associação, até porque pouco tempo antes tinha sido criada a APRE. “Prevaleceu que tínhamos realmente de criar uma nova
Instituição, que tinha a sua razão de ser, porque a APRE tinha uma visão das
questões que nos pareceu, inteiramente respeitável como é óbvio, mas comportava-se
como uma espécie de sindicato para pessoas idosas e pensionistas. Achámos que
isso é uma vertente útil e importante, mas que não cobria todo o espectro das
nossas preocupações, e até das mais relevantes” prossegue o Dr. Regueira.
Acontece que, reconhecendo a importância de questões que dizem respeito à
defesa das reformas e das pensões, o CID Sénior queria abranger mais do que
isso. “Se as coisas tinham chegado ao ponto a que
chegaram é porque tinha havido uma campanha de denegrimento para com a
população sénior. Nós entendemos que tínhamos longas carreiras profissionais
atrás de nós, atingido patamares de conhecimento e de capacidade de reflexão
relativamente importantes, tínhamos muitas ideias sobre aquilo que importava
fazer em Portugal e não achávamos que esses idiotas que faziam essa campanha
contra nós teriam a décima parte do conhecimento que nós tínhamos para dar
contributos válidos ao país” completa o Presidente. Nasce então o CID Sénior, o movimento para a cidadania
sénior, cujo principal objecto segundo os estatutos da Associação, “é a
promoção da imagem do cidadão sénior, a potenciação do seu papel na sociedade
portuguesa, a valorização e operacionalização das suas capacidades e
competências e a afirmação e defesa dos seus direitos e interesses legítimos”.
Neste âmbito, e para o efeito dos objectivos referidos, entre
outras, a Associação pode desenvolver actividades como:
- Fomentar o agrupamento dos seniores para a defesa dos
interesses que lhes são próprios;
- Realizar acções que favoreçam a difusão da imagem do
cidadão sénior, incluindo estudos e debates que permitam conhecer melhor a
actividade dos seniores nos mais diferentes sectores económicos, sociais e
culturais;
- Estudar e propor áreas e meios eficazes para a expansão
do papel dos seniores na sociedade portuguesa, especificando as actividades
onde ele se torne mais útil e valioso;
- Participar na criação ou no desenvolvimento de
instituições de ensino ou aprendizagem de matérias que tenham um papel relevante
na formação e aquisição de conhecimentos e competências de especial interesse
para os seniores;
- Estudar e apresentar propostas com vista à defesa do
direito à habitação por parte dos seniores, no quadro da legislação geral sobre
a habitação e o arrendamento;
- Apoiar ou comparticipar em acções úteis à melhoria das
condições de vida da população sénior;
- Fomentar ou comparticipar na criação ou desenvolvimento
de actividades específicas de interesse para a população sénior, em particular
as que visam a prestação de serviços no local de residência, favorecendo a
permanência do sénior no seu domicílio habitual;
No sentido destas actividades, e apesar das diferenças,
ilustrando bem a proximidade e convergência de interesses entre o Movimento Cid
Sénior e a APRE!, ambas as instituições se uniram, com o apoio dum associado
constitucionalista, para lutar contra um projecto de lei de fusão dos regimes
de pensões do sector público e privado. “Nós achámos
que era inaceitável e munimo-nos dum estudo muito bem feito e eu fui entregá-lo
ao Tribunal Constitucional, com duas cartas, uma em nome do Cid Sénior e outra
em nome da APRE! Foi em tão boa hora que foi talvez a única vez, pelo menos que
me recorde, que o Tribunal Constitucional declarou a medida inconstitucional
por 13-0 ou seja, por unanimidade” refere o Dr. Alberto Regueira.
O Cid Sénior estava já com um pequeno plano de
actividades estruturado, quando alteraram as suas prioridades para o que
pretendiam então realizar, isto após a apresentação do Guião para a Reforma do
Estado pelo Vice-primeiro-ministro. “Ficámos com os
cabelos em pé! O engraçado é que era uma coisa com cento e poucas páginas, mas
a apresentação do texto na página dava origem a grandes espaços nas linhas,
nitidamente para fazer parecer uma coisa muito comprida, mas chegado à
conclusão, aquilo a uma letra normal seriam para aí umas 30 páginas e na
prática, aquilo era objectivamente palha. Torcia-se e não saía rigorosamente
nada” afirma o Presidente do Movimento. Puseram de parte o plano de actividades,
e dedicaram-se então a fazer uma contribuição a sério para a reforma do Estado.
Arranjada a metodologia, definiram-se 27 temas em 6 categorias diferentes
nomeadamente; A Organização do Estado;
Funções de Soberania; Funções de Interesse Social; Regulação Económica;
Desenvolvimento Económico; Novos Desafios. Para o efeito, encontraram-se
pessoas extremamente capacitadas em cada uma das áreas, e o Movimento para a
Cidania Sénior editou então, com o apoio da Gulbenkian, um livro de 559 páginas
para dar as suas contribuições ao Estado. Como na altura da edição ainda não
tinham sido as eleições, o passo seguinte foi reunirem-se com alguns partidos
para que estes pudessem usufruir deste contributo, e quem sabe reconhecê-lo e
aplica-lo. Dos partidos contactados, foram recebidos pelo Livre, Bloco de
Esquerda, CDS, PS e Partido Ecologista os Verdes, sendo que o PCP, o PSD e o
PDR não se mostraram interessados. “A ideia era
conversar com eles e convidá-los a aproveitarem o máximo possível as nossas
ideias. Dissemos inclusive que nós não cobramos copyright, e que podiam
copiá-las à vontade” diz-nos o Dr. Regueira. Foram editados 500
exemplares, e ainda se encontram alguns nas livrarias, mas terminado esta fase,
o movimento não estagnou, e está na organização de ciclos de conferência que
irão abordar temas de interesse nacional, europeu e mundial. O objectivo é
fazer 1 por mês, até 2017, com a excepção do mês de Natal os de férias. As
dificuldades que o movimento enfrenta “naturalmente são
de ordem financeira. Muitas das coisas que nós gostaríamos de fazer, precisamos
obviamente que haja alguém que patrocine. As quotas são simbólicas, de 1 euro
por mês, e a ideia é essa porque obriga a haver voluntariado ativo, e para que
seja acessível a todos” completa o Presidente da Direcção.
Após esta agradável conversa, não nos despedimos sem que
o Dr. Alberto Regueira concluísse com algumas verdades. “Os seniores são cidadãos que arrastam atrás de si longas
carreiras profissionais e experiência de vida e bom senso. Costuma dizer-se que
quando morre um sénior é como uma biblioteca que desaparece, porque há todo um
conjunto de informação, de experiência de vida, conhecimento e competência que
naturalmente só é parcialmente transmissível às futuras gerações. Os seniores
não são umas pessoas coitadinhas a quem se ajuda a atravessar a rua,
eventualmente isso pode ser necessário, mas também por exemplo o Ministro das
Finanças da Alemanha também anda numa cadeira de rodas. O que interessa é que
as pessoas tenham a cabeça em ordem, e nós temos o direito de nos pronunciarmos
sobre todas as grandes questões importantes para o país, não só para os
seniores, mas sobre tudo aquilo que importa aos nossos filhos, aos nossos
netos, ao sistema económico, ao sistema de protecção social, de saúde,
educacional. E por outro lado, esse direito é também um dever de cidadania.
Reivindicamos um estatuto de cidadania integral, com direitos e deveres”
termina o Presidente.
CIDSÉNIOR: Movimento de Cidadania Sénior
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