Como no ensino normal, as Universidades Sénior respeitam também os períodos lectivos e as férias. Assim, com o aproximar do final de ano lectivo, decidimos acompanhar de novo o trabalho da UNISSEIXAL e dos seus alunos. Desta vez escolhemos uma linda forma artística com milhares de anos, com origens chinesas, a pintura em porcelana.
Escoltados
até à sala por uma das alunas, rapidamente somos apresentados aos 13 alunos lá
presentes. A alegre turma acolhe-nos simpaticamente, mas são rápidos a voltar
às suas criações ou a pôr a conversa em dia. Dos 13 alunos, apenas dois eram
homens, e a turma era ainda leccionada por duas professoras. Semelhante às
outras aulas, a boa disposição e o convívio reinam na Pintura de Azulejos. Para
todas as mesas que olhávamos víamos peças de porcelana lindíssimas. Pratos,
jarras e travessas pintadas à mão, reflectiam todo o espírito artístico de cada
pessoa. À sua frente, todos os alunos tinham obras espantosas, que podiam muito
bem ter espaço numa loja, mas invés disso, estes criadores optavam por
oferecê-las como prendas aos familiares e amigos.
As senhoras divididas em grupo e mais
capacitadas para as multitarefas, conversavam entre si enquanto pintavam
cuidadosamente os padrões na porcelana. Já o Sr. Raposo e o Sr. Costa, os
únicos homens da sala, permaneciam em silêncio na mesa mais próxima da entrada,
focados e dedicados exclusivamente ao seu trabalho. A professora Fernanda
Cunha, dá a sua opinião relativamente à cor a combinar com a pintura em azul
que o Sr. Costa tinha numa travessa. “O Sr. Costa faz aqui coisas lindas”
comenta connosco a professora. “Ainda estou a aprender” retribui o aluno, com
um tímido e humilde sorriso. De facto, entre a travessa e uma tampa de um pote,
a forma cuidadosa e perfeccionista que aplicava a cada pincelada captaram a
maior parte da nossa atenção.
O
Sr. Costa estava tão concentrado no seu trabalho, que decidimos não
interromper, e dirigimo-nos então para conversar com a bem disposta Sra.
Eugénia Amor. A finalizar o seu 1º ano na Universidade Sénior do Seixal,
garante-nos que no próximo ano estará inscrita de novo. “Inscrevi-me na
UNISSEIXAL porque estava com uma depressão. Vim para pintura de porcelana,
porque gosto destas áreas artísticas, e ajudou-me bastante” confidencia-nos. “Perdi
a minha mãe e agora estou a superar melhor”. Desempregada e com 56 anos, já
tinha estado a aprender pintura em tecido numa loja, e diz que ao contrário do
que se passou na universidade, só agravou a sua depressão. “Aqui ando bem
disposta e já fiz novas amizades. É óptimo para convivermos e conhecermos
pessoas novas”. Frequenta também inglês e bordados, mas com o telemóvel,
mostra-nos com orgulho fotos das peças de porcelana que já criou. “Já fiz umas
6 ou sete peças. Ofereci uns e outros já estão lá em casa” diz-nos. Eugénia
Amor sente-se tão bem como aluna da UNISSEIXAL que admite passar os
fins-de-semana ansiosa de voltar às aulas. “O meu marido ainda está a
trabalhar, mas eu já o aconselhei e quando se reformar vem comigo” conclui.
De repente, um agradável silêncio
instala-se na sala. Um claro sinal de que todos os alunos estavam agora
completamente mergulhados nas suas pinturas. “Ai que silêncio tão bom! Entra a
inspiração e tina o piu” comenta a professora Fernanda Cunha. Os risos e a
conversa voltam rapidamente, entre todos os alunos. De aluno em aluno, a
professora Fernanda Cunha vai dando a sua ajuda e divertida comenta “Nós somos
todos da 2ª idade. A terceira idade é para quando ficarmos em casa”.
Uns fazem os desenhos em papel
químico, outros vão canetando os contornos na porcelana, e a maior parte vai
colorindo as suas obras. António Raposo, aos 65 anos, é aluno da Universidade
Sénior do Seixal há 3 anos. “Inscrevi-me para aprender, e também para passar o
tempo, em vez de estar nos jardins e tabernas” diz-nos. O aluno, que não ficou
seduzido pelas aulas de inglês, optou por começar a aprender a tocar
cavaquinho. Apesar de ainda estar a aprender, não coloca de lado a opção de no
futuro poder vir a integrar uma banda. Quando à pintura em porcelana diz
“Quando soube que havia achei interessante. Fiz a iniciação, aprendi as
técnicas e já estou cá há 3 anos. Já fiz mais de 20 peças, que foram
principalmente para oferta”. António Raposo, já aprendeu também ginástica e
informática. Com os computadores admite ainda não se entender muito bem, “ainda
estou cru”. Na sua mesa tinha dois pratos com amoras do seu quintal. “Quando as
apanho trago-as para quem quiser. Tenho lá muitas, e é melhor do que se
estragarem”. E segundo uma colega, que não conseguiu resistir aos frutos
silvestres, eram mesmo muito boas. Antes de voltar à sua pintura, António
Raposo ainda nos diz “Mantermo-nos ativos é importante. Quando chegamos à
reforma vamos ficar parados. Aqui a cabeça está sempre a trabalhar. É uma
espécie de regresso às aulas e já lá vão mais de 30 anos desde que estudei”.
Para comemorar o final do ano
lectivo, a professora Fernanda Jacinto refere que tem de haver um almoço ou
lanche. No meio de todo aquele bom ambiente, podemos dizer que esse almoço, não
passa de uma boa desculpa para todos voltarem a conviver e a partilhar
experiências e gargalhadas. Antiga professora de 1º ciclo, Fernanda Jacinto foi
a 1ª professora a voluntariar-se para dar aulas, ainda pela Casa do Educador,
antes de existir a Universidade. “Comecei principalmente porque estava em casa
sem nada para fazer”. Apesar de não ter sido a sua área de ensino enquanto
trabalhava, dedica-se agora exclusivamente a ensinar pintura em porcelana, e dá
também workshops de pintura em tecido. “Aprendi pintura em porcelana com uma
amiga. É um hobbie muito giro. Quando se começa, deixa um bichinho, eles que
vos digam” referindo-se aos alunos. A professora, para além de ensinar e
ajudar, é ainda uma peça essencial para as obras. É Fernanda Jacinto quem leva
a louça para casa e cozê-la, para que os alunos depois possam pintá-las. “Eles
no primeiro ano tiveram uma boa adaptação. Começaram com algumas dificuldades,
principalmente em espalhar a tinta e em canetar devido aos tremores. Os homens
mais dificuldades em combinar as cores” diz-nos a professora. Falando dos
benefícios das aulas, Fernanda Jacinto realça o convívio, visto que muitas
pessoas não o têm em casa e encontram ali uma boa forma de conviver, e claro,
usarem toda a sua criatividade para criarem bonitas peças. “Eu já estou a fazer
uma para herança” brinca uma aluna.
Ao abandonarmos a aula,
despedimo-nos de uma turma com pessoas dos 56 aos 82 anos, que tão bem nos
receberam e nos mostraram que a reforma não é o fim de nada, mas o início de
uma outra fase da vida, onde a felicidade e novos projectos estão disponíveis
para quem se mostrar disponível. À turma de Pintura em Porcelana da UNISSEIXAL,
o nosso obrigado.
Aula Sénior de Pintura em Porcelana
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