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Na Esplanada com Nicolau Breyner


João Nicolau Melo Breyner Lopes nasceu a 30 de Julho de 1940 em Serpa. É difícil não nos lembrarmos de ver Nicolau Breyner a representar na televisão portuguesa. Aos 73 anos, é complicado contabilizar todas as personagens que interpretou na televisão e no Cinema. Ganhou 3 Globos de Ouro na categoria de melhor actor e são muitos os projectos ainda por realizar. É conhecido por ter vivido a sua vida intensamente mas há alguns começou a pensar nas vantagens de saber envelhecer. Saiba um pouco mais sobre o actor que já conta com mais de 50 anos de carreira.

- Muitos dos nossos leitores acompanharam grande parte da sua carreira. O que é que as pessoas no geral julgam saber sobre o Nicolau Breyner que na verdade não sabem?
Não sei depois de 53 anos de exposição, é difícil haver algumas coisas que as pessoas não sabem sobre mim. Tirando aquelas coisas que eu não digo, acho que sabem quase tudo sobre mim. Toda a gente sabe que eu não nasci em Lisboa, que sou muito ligado ao campo, que não gosto de cidades, não gosto de frio e só gosto de calor, que prezo a amizade… tanta coisa.

- Como foi adaptar-se à vida da capital quando saiu de Serpa?
Quando se vem com a minha idade, as crianças adaptam-se com a maior facilidade. Eu vim de lá com 9 anos, se bem que as minhas raízes estejam lá e volto sempre que posso. Ao princípio foi estranho, era um miúdo que estava habituado a sair de casa, iam-me buscar para me levar à escola e depois fora disso montava à cavalo e andava pelos campos. E de repente vejo-me numa cidade, a morar num andar que era uma coisa muito estranha para mim, era uma espécie de gaiola sem horizonte. Mas depois habituei-me e tornei-me numa criança, num jovem e num homem de lisboa como sou hoje em dia. E acredite que Lisboa é uma das cidades mais bonitas do mundo e olhe que eu conheço muitas.

- Teve algum receio, na altura, de largar o curso de direito pelo conservatório?
Não, sempre fui uma pessoa muito pouco receosa, ainda o sou então nessa idade não tinha medo de nada. Nessa altura tomava as decisões e ia com elas para a frente, por isso não me custou nada.
- Até hoje qual foi o papel mais difícil ou mais exigente de representar?
Não faço a mínima ideia, é uma coisa que não sei responder. Repare isto é como a música, qual é a musica da sua vida? Não existe a música da minha vida quando se chega à minha idade. Existem várias músicas da nossa vida. As músicas, tal como os papéis, têm a importância que têm naquele determinado momento. Houve alturas que pensei que tinha feito o melhor papel da minha vida, mas depois veio outro e outro, então deixei de contabilizar isso. Consigo tirar prazer da maioria dos papéis que faço.

Já afirmou, várias vezes, que para se representar as coisas devem surgir naturalmente, como uma brincadeira. Acha que as pessoas se esforçam demais para representar em vez de deixarem-se levar pelo papel como numa brincadeira?
Isso é uma boa pergunta, porque eu acho que isso acontece muitas vezes. As pessoas esquecem-se que estamos a brincar, é tudo no fundo um faz de conta que sou não sei o quê. E temos que saber emocionar as pessoas e fazer o nosso melhor, isso sim é muito importante. Depois há pessoas mais capazes e outras menos. Agora não vale a pena estarmos a pensar, agora tenho que representar, tenho que fazer muita coisa… Não tens que fazer nada. Como disse um actor americano, já não me recordo ao certo quem foi, mas disse para outro actor mais novo, quando ouvires acção não tens que fazer nada, é só estar, deixa-te andar. É como eu costumo dizer, deixem fluir, digam as primeiras frases e depois deixem fluir o papel. 

- Mesmo tendo recebido 3 Globos de Ouro acha que faltam mais prémios que distingam o talento dos artistas portugueses?
Nós somos muito avaros em prémios e muito pródigos em críticas. Devia haver mais prémios e incentivos. Todas estas pessoas que optaram por deixar outras profissões, principalmente os jovens, por esta arte que é um olhar sobre a vida de outra maneira, com uma lente que é fantasia, deviam ser mais apoiadas, cuidadas e acarinhadas.

- Com mais de 50 anos de carreira, qual foi o maior elogio que recebeu profissionalmente?
Graças a Deus recebi muitos elogios. Recebi até hoje 32 prémios ou 33, não sei bem, estão arrumados lá em casa nem se quer estão expostos. Na altura da primeira peça que fiz, era normal no outro dia vir a crítica no jornal da mesma, eu fazia um papel pequenino. Então na crítica vinha a falar de todos os actores famosos da altura e no fim dizia assim, e quanto ao rapaz que se estreou hoje em palco, Nicolau Breyner, aquilo que o senhor faz não é representar é estar em casa. Portanto aconselho-o a mudar de profissão. Eu disse logo, isto é o melhor elogio que me podem fazer. Porque eu queria brincar, sentir-me em casa, não queria representar. Quando disseram isso ganhei, era isso que eu queria fazer, e o senhor enganou-se, não mudei de profissão. Talvez por isso seja o único elogio que guardei.

- Neste momento está a dar inicio a novos projectos na sua vida. Na sua opinião, o que faz falta a Portugal são pessoas com iniciativas e ideias novas?
Nós temos talentos espantosos em Portugal em diversas áreas e todos os dias temos provas disso, seja cá ou no estrangeiro. As iniciativas existem, tem é que ser acarinhadas por quem de direito. Mas nós somos um país com um problema gravíssimo, temos 10 milhões de habitantes, somos muito poucos, e por isso é que não é fácil termos preços acessíveis como em países que têm 6 vezes mais habitantes que Portugal. Agora as pessoas precisam ser acarinhadas e reconhecidos, não é preciso dinheiro, é preciso dar os parabéns e valorizar o trabalho das pessoas, é só preciso boa vontade.

- Brevemente irá abrir ao público a NBA (Nicolau Breyner Academia). É possível, alguém reformado, sem experiência profissional, mas que acredite ter talento para representar inscrever-se na NBA?
Claro que sim, faz uma prova de ingresso como qualquer pessoa que queira frequentar o nosso curso de 3 anos. Tem é que ter o equivalente ao 12º ano, senão vai entrar em matérias que são completamente novas para eles. Além disso, existem módulos de 4 ou 8 semanas, que não é necessário a prova de ingresso, qualquer pessoa pode fazer.

- Ouvimo-lo falar várias vezes que começou a saber envelhecer. 
Qual é para si a fórmula de saber envelhecer?
Vamos lá ser claros, envelhecer é das piores coisas do mundo. Pois envelhecer não é fácil. Saber envelhecer é só para alguns, é preciso ter uma grande bagagem.  Aquilo que nós adquirimos ao longo da vida, os afectos, a sabedoria, o bem-estar, a saúde, é isso que nos vai fazer saber envelhecer melhor ou pior. Agora há que saber envelhecer. O grande passo é assumir em frente ao espelho que eu sou velho. Aconselho toda a gente a ter a coragem de assumir a velhice. Agora dentro disto há imensas coisas para fazer. Sou velho, mas não estou morto, sou velho não é estou incapaz, sou velho mas posso ser um gajo brilhante. Há velhos que morreram a fazer coisas brilhantes, isso é que é muito importante.

- O que é que acha que falta aos seniores portugueses para envelhecerem melhor?
Acho que há falta de apoio aos velhos e não são só aos portugueses. Aqui há dias vi uma coisa lindíssima. Em Cabo Verde, houve um enorme sentimento de revolta por ter aberto um lar para a Terceira Idade. Porque para eles isso não faz sentido, a minha mãe ou o meu pai vai para um lar? Acharam uma coisa insultuosa e ficaram chocadas, mas isso é um sinal dos tempos modernos. Mas isso está ligado à forma de como fazemos as coisas e aí o problema não é dos lares e sim das famílias, de como são capazes de descartar as pessoas. A cultura do mais velho perdeu-se na cultura ocidental, europeia e americana. Nas outras culturas o velho é o respeitado, o sábio. Eu queria que tivéssemos mais respeito para com as pessoas mais velhas, sobretudo por tudo aquilo que já nos deram.

- E o que é que acha que falta a Portugal?
Falta dinheiro como todos nós sabemos, gastamos demasiado dinheiro durante muito tempo. Nós andamos com políticas desajustadas a achar que somos ricos e depois apercebemo-nos que não somos ricos. Somos um país pobre, que saiu da agricultura e da pesca porque a CEE disse-nos que era mau e agora somos acusados de não termos meios. Nós somos um país de agricultores, pescadores, comerciantes e isso não tem mal nenhum. Agora regressamos à origem mas com um upgrade, a exportar e a melhorar os nossos produtos por este mundo fora. E isso sim é óptimo. Temos um país notável, eu digo sempre, férias passo em Portugal, tem tudo aquilo que eu quero. Nós vamos sair desta crise, e eu digo isto sabendo e assumindo que sou um privilegiado neste país. Eu não acho nada mal os impostos que nos estão a ser atribuídos, é normal, porque é que estão todos a queixar-se, se ganhamos mais têm que nos tirar mais a nós. Agora temos que nos deixar de demagogias e realmente apresentar soluções concretas para sair da crise, não é dizer que há soluções mas depois ninguém sabe explicar quais são. Preferem apontar o dedo e criticar, mas isso é muito português.
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